quarta-feira, 3 de outubro de 2007


Eu tinha 5 anos na Copa de 1970. Mesmo assim lembro-me do clima de festa. Minha mãe, grávida de meu segundo irmão, querendo arrumar logo a casa porque meu pai chegaria mais cedo do trabalho. Afinal o Brasil ia jogar na televisão e isso era uma coisa especial.

Aliás, o filme será muito mais especial para essa geração da qual faço parte - que tinha de uns 5 a uns 15 anos nesses tempos do “Milagre Brasileiro”. A passagem do tempo é impressionante, experiência pessoal e única. Aos poucos vamos assistindo nossas lembranças pessoais de infância se transforarem em parte da memória coletiva do Brasil contemporâneo. O interior do fusca, a tv preto e branco, a antena com Bom-Bril, o Sugismundo, o álbum de figurinhas, o jogo de botão, o golaço, Pelé, Tostão, Aero Willis, DKW e ditadura. Tudo está presente nas cenas do filme e em nossas lembranças.

O cuidado com os detalhes cenográficos, a atuação das crianças, o roteiro impecável, tudo no filme impressiona. Além de uma leveza e sensibilidade original, pois, apesar do tema pesado, o filme se recusa à provocação do choro fácil ou a mais uma cena de tortura, tão comum em filmes sobre essa época.

A copa de 70 foi a primeira que o Brasil assistiu pela televisão e isso teve um impacto memorável. A música "Pra Frente Brasil" de Miguel Gustavo é até hoje lembrada e cantada por muitos. O coro de assobios da gravação original foi uma solução genial e inconfundível - além de ser bem difícil de imitar... Depois dessa música sempre lembramos a população do Brasil em 1970: 90 milhões. Hoje somos o dobro de pessoas em ação, mas ninguém atualiza esse número quando canta, a exemplo do Jota Quest que num lance de oportunismo gravou a música para a Copa de 2006.

"Pra frente Brasil" (1970) - Miguel Gustavo

Noventa milhões em ação,
Pra frente Brasil... do meu coração
Todos juntos vamos
Pra frente Brasil, Salve a Seleção!
De repente é aquela corrente pra frente,
Parece que todo o Brasil deu a mão...
Todos ligados na mesma emoção...
Tudo é um só coração!

Todos juntos vamos pra frente Brasil, Brasil!
Salve a Seleção !!! (bis)


Os filmes nos ajudam a pensar nossa experiência de mundo. Excitam nossa memória e imaginação. A ‘Copa de 70’ já tem mais uma referência obrigatória de arte e memória. E como na canção que comemora... Não me furto à vontade de terminar cantando o finalzinho do “Parabéns pra você”, com a empolgação de um menino: - Rá-tim-bum! Cao Hamburger, Cao Hamburger!

Ah! O filme foi escolhido para representar o Brasil na luta por uma vaga para o Oscar 2008. Houve quem preferisse o polêmico 'Tropa de Elite', mas a Academia de Hollywood não gosta de violência e talvez tenha uma simpatia especial pelos velhinhos do Brooklim paulistano! Shalom!

O ano em que meus pais saíram de férias

2 comentários:

Unknown disse...

Esse filme realmente é bom, de uma grande sensibilidade...
Lendo, lembrei de uma outra relação interessante...
Quem viu o filme Hotel Ruanda sabe o que aconteceu no meio do ano de 1994 naquele país. E nós estavamos aqui, assistindo ao Romário.

DELMONTE disse...

Hotel Ruanda é um daqueles filmes que denunciam uma situação que o mundo nem reparou - ou como disse 'bá' - enquanto víamos o Romário. O que aconteceu em Ruanda entre Hutus e Tutsis é o que acontece todos os dias entre o assaltante e a vítima, entre o fanático e o antagonista, ou seja, a incapacidade de se reconhecer no outro. Ver o outro como um igual.

O problema aumenta quando isso toma proporções massivas, pois uma multidão com uma idéia fixa podem se tornar incontroláveis. Mas estando na periferia do capitalismo como Ruanda, ninguém vai prestar atenção mesmo - e menos ainda quando o centro avante avança com a bola dominada para dentro da pequena área...